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Passar poesia entre grades

Project: A Poesia não tem Grades

Filipe Lopes inebria os presos com poesia. Florbela Espanca, Pessoa, José Luís Peixoto, Gedeão. E lê poemas de amor “porque eles precisam de falar nisso”. “Eles” são reclusos hoje, homens e mulheres livres amanhã.

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“A única forma de eu conseguir ser justo e honesto é não fazer juízos sobre a pessoa que tenho à minha frente”, diz Filipe Lopes.

Nessa altura, começou por levar ao Estabelecimento Prisional de Sintra e à prisão feminina de Tires aquilo que então já levava (havia mais de 20 anos) a escolas, bibliotecas, hospitais – “Sempre tive essa preocupação de levar o livro e a leitura a todas as pessoas”, diz Filipe Lopes.

Continua a ser assim mais de dez anos depois, agora que percorreu quase todos os estabelecimentos prisionais do país – sem nenhum (ou quase nenhum) apoio desde 2009. “Quando deixei de ter apoios, achei que devia continuar. Achei que valia a pena ser voluntário.” Por algo em que acredita. “Se 1% da população prisional se sentir bem dentro da prisão, já é bom.” Os presos são pessoas que um dia estarão em liberdade, enfatiza. “As pessoas esquecem-se disso.”

 
Durante a sessão, fica numa sala com 20 reclusos (ou menos ou um pouco mais). “Eu não sei quem são, nem as penas que cumprem, nem quais os crimes. Sentir-me-ia muito condicionado. Prefiro não saber a razão por que estão lá. Para fazer este trabalho, temos de estar desapegados dos nossos preconceitos.” E insiste: “A única forma de eu conseguir ser justo e honesto é não fazer juízos sobre a pessoa que tenho à minha frente”.

 
São condenados de todo o tipo: por pequenos furtos ou, a maioria, crimes relacionados com droga, mas também condenados por pedofilia, violação, homicídio e crimes financeiros. Filipe Lopes, que é formado em Psicopedagogia, conheceu todo o tipo de prisões: regime aberto ou semiaberto, média, alta segurança. Ou muito alta segurança como Monsanto, onde, numa das sessões, teve de descer vários lances para chegar a uma sala subterrânea onde estava um pequeno grupo apenas. “Era um sítio onde só podiam estar cinco pessoas de uma vez.”

 
E no entanto, a entrega deles, aqui, foi muito mais positiva do que em prisões, com menos restrições, onde encontrou um ambiente pesado e pouca receptividade; por exemplo em cadeias onde reconheceu, no grupo, figuras públicas. Estas pessoas participam porque querem mas não se envolvem da mesma maneira nas sessões de poesia. “O grau de frustração é muito maior para pessoas que antes viviam longe de imaginar que um dia seriam presas. Não lidam bem com a situação”, diz Filipe Lopes. Assim explica “o clima pesado” encontrado nestes casos.

 

Reportagem publicada por Ana Dias Cordeiro em 29 de Dezembro de 2014 no Público

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